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sexta-feira, 20 de março de 2015

“É o desgaste que condena. A pena é o processo!”

por Dalmo Oliveira

  Em 2013 o jornalista sergipano José Cristian Góes recebeu um convite para prestar um depoimento inusitado numa audiência pública na sede da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA), em Washington. Na CIDH Góes falou sobre os processos judiciais (criminal e cível) que o desembargador Edson Ulisses, vice-presidente do Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe, e o Ministério Público Estadual sergipano moveram contra ele por conta de uma crônica ficcional intitulada      “Eu, o coronel em mim”, publicada em seu blog. O texto não citava nome de pessoas, cargos, locais e tempo.
   Em 2013 o jornalista sergipano José Cristian Góes recebeu um convite para prestar um depoimento inusitado numa audiência pública na sede da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA), em Washington. Na CIDH Góes falou sobre os processos judiciais (criminal e cível) que o desembargador Edson Ulisses, vice-presidente do Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe, e o Ministério Público Estadual sergipano moveram contra ele por conta de uma crônica ficcional intitulada




            Criminalmente, o jornalista já foi condenado a sete meses e 16 dias de prisão e, na parte cível, lhes foi imputada uma multa de R$ 30 mil. Góes esteve no Recife na semana passada onde falou do caso na mesa de abertura do Encontro Nordestino de Direito à Comunicação, que reuniu cerca de 300 ativistas da região que militam pela democratização dos meios de comunicação. Realizado pelo Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) e pelo Centro de Cultura Luiz Freire, o evento ocorreu na Universidade Católica de Pernambuco, no bairro de Boa Vista.

            Depois da palestra, Cristian Góes falou com exclusividade para o Direto do Sanhauá. Veja a seguir o resumo da nossa conversa:

            Para o jornalista, que já foi presidente do sindicato de sua categoria em Sergipe, o sistema judiciário brasileiro se configura, nos dias atuais, como o principal aparelho de censura à imprensa. Ele também diz que o debate sobre a liberdade de expressão e o direito à comunicação é um tema “interditado” na atual sociedade brasileira.

            Góes diz que seu processo foi uma demonstração clara desse tipo de censura, e que sua punição funciona como uma espécie de repressão pedagógica para outros jornalistas que ousem criticar alguns setores dos poderes públicos constituídos, especialmente o próprio poder judiciário:  “O processo contra um jornalista ele é diferente de um processo contra qualquer outra pessoa. Você processa um professor, terá repercussão na vida do professor, as pessoas vão ficar sabendo. Mas quando você processa o jornalista por conta do exercício profissional, terá grande reflexo na sociedade, de impedimento dos outros jornalistas. Porque ele tem um efeito pedagógico profundo. No meu caso, por exemplo, você pode descobrir qualquer escândalo sobre o Tribunal de Justiça lá em Sergipe e você não vai ter nenhuma matéria sobre esse caso, porque o efeito das minhas condenações tem um efeito pedagógico”.

         
Cristian Góes: Judiciário é o novo aparelho de censura | Fotos: Dalmo Oliveira
O jornalista falou ainda do impacto moral, psicológico e cognitivo que uma ação penal como a que sofreu causa nos indivíduos processados injustamente por conta de sua atividade profissional:  “O primeiro impacto na vida pessoal é a vontade de desistir da profissão, a primeira coisa é um desânimo, desistência de escrever, de estar envolvido com essas coisas. Quando você sofre uma condenação que é injusta, você fica decepcionado, revoltado. Mas logo no momento posterior, para quem tem compromissos, por exemplo, que este caso não seja um caso individual, que seja um elemento de estimular o debate sobre a liberdade de expressão. Para mostra para a sociedade que a liberdade de expressão ela não está garantida!”.

Crimes de imprensa

            Cristian Góes diferencia os processos acionados contra jornalistas que cometem injúrias e difamações e contra jornalistas que defendem os direitos sociais coletivos: “A luta transformada em coletiva ajuda. Porque quando um jornalista é condenado, muitas vezes justamente, por um crime de fato, ter feito alguma coisa equivocada, errada etc, a gente não vê grandes mobilizações em sua defesa. Porque as pessoas, os movimentos sabem o que é e o que não é. Eu acho que essa capacidade coletiva é o que faz esse tipo de separação. Quero dizer que não sou contra ações judiciais contra jornalistas: nós temos responsabilidades, claras, objetivas. O que não pode é usar mecanismos judiciais de poder para inibir noticias que comprometem o poder. Essa luta pela liberdade de expressão, pelo direito à comunicação, tem duas questões: uma coisa é a liberdade de expressão, outra coisa é a expressão. Ora, jamais um jornalista vai ser penalizado na defesa pela vida, à liberdade, pelo direito à terra, pelo direito à saúde, educação de qualidade, pelo respeito à Constituição, isso é o direito à liberdade de expressão!... Mas um jornalista que se utiliza de uma retórica da liberdade de expressão para estimular o crime, o ódio, o racismo, a intolerância, esse vai ser penalizado, não pela liberdade de expressão, mas por conta da expressão, porque a liberdade de expressão não se associa com ódio, com racismo, com intolerância, a liberdade de expressão tem um outro patamar”.








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