Paula, Eduardo e Dalmo: Diálogo sobre mídia e racismo
Por Dalmo Oliveira
De passagem por Salvador, para tratamento médico, pude participar nesta quarta-feira, dia 7, de alguns eventos comemorativos ao Dia dos Jornalistas. No período da tarde, fui um dos convidados da Agência Afro-Latina-Euro-Americana de Informação (ALAI), para o Cine-fórum, com exibição e debates de filmes sobre mídia e intolerância, aberto à comunidade. A roda de diálogos ocorreu na Casa da Nigéria, no coração do Pelourinho.
Durante cerca de duas horas discutimos a temática na agradável companhia do sociólogo Dudah Oliveira, roteirista e argumentista do curta “É prá Pira-já”, que retrata uma situação inusitada em que assaltantes de um coletivo decidem poupar os passageiros negros. Oliveira trabalhou por dez anos no Ibase e atualmente desenvolve um projeto para produção de um filme tendo o cangaço como temática. “Se você botar um PM e um porteiro de prédios da zona sul do Rio de Janeiro para distinguir quem é preto e quem não é, não terá erro”, diz o sociólogo, ao afirmar que algumas categorias de trabalhadores funcionam como “operadores do racismo” no Brasil.
Para Ana Alakija, coordenadora da ALAI e membro da Comissão de Jornalistas pela Igualdade Racial do Sindicato dos Jornalistas da Bahia (Cojira-BA), que organiza o Cine-fórum, é urgente uma ação de educação para a mídia, visando municiar jornalistas e cidadãos para o trato da questão étnico-racial nos meios de comunicação.
SINJORBA
Do Pelourinho seguimos para o Hotel Pestana, no Rio Vermelho, onde o Sinjorba promoveria o debate “A Comunicação pós 1ª Confecom”, com a presença do presidente da FENAJ, Sérgio Murillo, e do chefe da Assessoria Geral de Comunicação do Estado (Agecom), Robinson Almeida.
O evento foi aberto pela presidente do Sinjorba, Kardelícia Mourão, que fez uma fala de despedida ao assegurar que não pretende mais estar à frente da entidade depois que terminar seu mandato em julho próximo. Kardé, como é mais conhecida, fez uma fala emocionada sobre a recente desregulamentação da profissão e afirmou que o Sinjorba não vai sindicalizar ninguém por decreto que não possua o diploma superior de jornalismo expedido pelo MEC.
Ela passou a palavra para Robinson Almeida da Agecom, que fez uma longa fala sobre questões pontuais da relação institucional do Governo da Bahia com os profissionais de imprensa e comunicadores de uma maneira geral. Ele ressaltou a importância da realização da CONFECOM dando destaque ao fato de que o governo baiano realizou a primeira conferência estadual brasileira ainda em 2008. Para Almeida, só um governo com as características populares com o da Bahia teria vontade política de realizar tal evento, dando um exemplo para o restante do país.
Para o executivo da comunicação institucional da Bahia, os movimentos sociais devem aproveitar o ano eleitoral para cobrar dos candidatos compromisso na implementação das deliberações da 1º CONFECOM. Almeida ainda falou sobre o avanço dos blogueiros no interior do estado e da importância das mídias regionais para manutenção das identidades culturais locais. Ele também acha que esse ano vai crescer a influência no eleitoral de uma chamada “militância virtual”, a exemplo do que ocorreu com a eleição do presidente Barack Obama nos EUA.
FENAJ
O presidente da Fenaj, Sergio Murillo, foi o próximo orador da noite. Ele anunciou, inicialmente, que a Câmara de Vereadores de Natal (RN) aprovara, naquele dia, projeto de lei que exige diploma para contratação de jornalista no serviço público da capital potiguar, através de concurso público. Murillo também falou sobre o protesto que vai ocorrer no próximo dia 23, quando haverá uma mobilização dos sindicatos comemorando a saída de Gilmar Mendes da presidência do STF. "Já vai tarde!" é o nome do protesto que os sindicatos dos jornalistas farão por todo o país. "Preparem o caxãozinho dele aqui em Salvador", sugeriu o dirigente sindical.
Murilo foi o convidado de honra ontem em Salvador nas comemorações do Dia do Jornalista. Ele anunciou que não vai concorrer ao 3º mandato. Sobre a Conferência de Comunicação, o presidente da Fenaj criticou alguns setores dos movimentos sociais que, segundo ele, queriam transformar a Confecom numa espécie de Fórum Social Mundial, sem a presença do empresariado do setor.
Sergio assegurou que os jornalistas foram pioneiros em defender uma conferência nacional para discutir a comunicação e que a categoria compôs a maior bancada de delegados durante a realização do evento em Brasília. Para Murillo existem agora três frentes de ação para fazer com que as deliberações da CONFECOM saiam do papel. A primeira frente é a da luta pela regulação de algumas deliberações, que podem ser feitas imediatamente pelos poderes executivos.
Segundo o presidente da Fenaj, o Conselho Nacional de Comunicação pode começar a funcionar ainda nesse primeiro semestre, sendo composto, basicamente, pelos mesmos membros da comissão organizadora da CONFECOM. Alguns nomes deste mesmo grupo também estão sendo indicados para compor o Conselho Curador da Empresa Brasil de Comunicação (EBC). Ele também acha que a Secretaria de Radiodifusão Comunitária deveria ser criada urgentemente por decreto presidencial, dentro da estrutura do Ministérios das Comunicações.
A segunda frente de ações, deve ser a luta pela regulamentação, via casas legislativas, das deliberações que precisariam ser transformadas em leis específicas, como um novo marco regulatório para a comunicação eletrônica (internet etc). Uma terceira frente diz respeito à manutenção da sociedade civil em torno das demandas da CONFECOM. Murillo disse que o FNDC já iniciou negociações com o governo federal no sentido de promover ainda em 2010 um encontro nacional de representantes do movimentos sociais. O fórum também deve apoiar a realização de um seminário internacional de legislação comparada na área de regulação do setor de comunicação. “É preciso mostrar, principalmente aos empresários do setor, que em países como França, Espanha, Canadá, Argentina e até Estados Unidos existem marcos regulatórios até para controle social dos conteúdos nos meios de comunicação”, disse o dirigente da Fenaj.
Com baixíssima participação da categoria, os eventos em comemoração pelo Dia do Jornalista na Bahia mostraram o impacto do desgaste que a desregulamentação da profissão causou na autoestima destes profissionais. Os eventos promovidos pelo Sinjorba também mostraram a dependência institucional da entidade ao poder público local, com as mesas sendo compostas apenas por autoridades patrocinadoras, sem abertura de representação para os movimentos sociais que gravitam em torno da causa dos jornalistas, como as Cojiras, o movimento de comunicadores comunitários etc.
A extrema institucionalização das comemorações tornou os debates acépticos a qualquer ponto de vista divergente da concepção discursiva adotada pela atual diretoria do Sinjorba e da Fenaj. Com isso o debate se tornou monológico, refletindo o pensamento único das correntes político-ideológicas que monopolizam as gestões das entidades promotoras.
Percebe-se uma espécie de autismo autoritário e autofágico das lideranças sindicais, que na Bahia monopolizam a gestão do Sinjorba há quase 20 anos. Com a proximidade do período eleitoral parlamentar, do poder executivo e também nas entidades sindicais dos jornalistas e na própria Fenaj, eventos como esse mostram a fragilidade de um modelo que ignora as diversidades que compõem os movimentos sindical e social, na Bahia e no Brasil.
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Dalmo Oliveira é jornalista e editor nacional e saúde da alaionline
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