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terça-feira, 28 de abril de 2015

Intercâmbio: o novo paradigma comunicacional



por Antônio Heberlê*
A forma com que ocorre a compreensão e os sentidos que as pessoas dão às coisas são incontroláveis. Por mais eficiente que seja a comunicação, não há como controlar o que cada um pensa e muitas vezes a recepção se dá totalmente ao contrário da expectativa do emissor. A máxima do processo comunicativo faz com que a percepção, conhecimento e adoção de tecnologias, por exemplo, seja sempre difícil e quase improvável. O fenômeno da improbabilidade da comunicação interessa às empresas. Interessa a quem tenha por missão ofertar informação qualificada para gerar comportamentos inovadores, melhores e diferentes. As instituições vencedoras aprenderam a ter propósitos, ações e discursos claros, para ultrapassar a entropia e as dificuldades naturais do improvável processo comunicativo. Neste cenário é importante esclarecer para que, o que, como e para quem se produz.



Um dos estudos mais respeitados a esse respeito é do semiótico norte-americano Charles Sanders Peirce. Ele escreveu um artigo específico sobre isso, chamado “O nome das coisas”. Em “Como tornar as nossas ideias claras (how to make our ideas clear)”, descrito nos Collected Papers (V, 388-410), ele foi mais longe. Segundo Peirce “uma ideia clara é definida como uma que é apreendida de tal forma que será reconhecida onde quer que se encontre, de modo que nunca será confundida com outra. Se esta clareza faltar, dir-se-á então que é obscura” (C.P. 389). Ainda neste mesmo artigo Peirce diz que o fato de se expressar com ideias claras é uma das condicionantes para que sejam também verdadeiras, embora uma e outra não devam ser confundidas, pois há pessoas que são absolutamente claras, e mentirosas.
A clareza dos conceitos é um dos aspectos fundamentais em todas as áreas do conhecimento, mas ainda mais necessária quando se trata do campo da ciência, da tecnologia e da educação. Adversária, a imprecisão leva a confusão e ao descrédito, pois as pessoas e as instituições são vistas pela sociedade como se mostram a ela. Por isso manter a clareza do que elas dizem sobre si mesmas e o que fazem é um valor que pode fazer toda a diferença.
Em princípio a questão que coloco pode parecer apenas um problema de informação, mas não é. Vivemos na sociedade imersa de fontes, canais e mensagens, como nunca na história da humanidade. Não falta volume de informação, mas falta comunicação, falta clareza e a incomunicação é capaz de gerar conflitos que vão de uma discussão familiar ou entre amigos para as guerras entre povos.
Sentar e conversar, dialogar, respeitar o olhar do outro sobre os fatos, desarmar-se de preconceitos e aprender a olhar o mundo com a visão nova apreendida é muito desafiador para o paradigma da sociedade da informação. Será necessário dialogar mais, e os sinais para a necessidade de viver neste
novo paradigma estão muito presentes em todas as esferas, com destaque para os campos da política e dos negócios. Empresários, executivos e legislativos atentos deram-se conta que já não basta apenas informar, mas precisam conversar com a sociedade, ouvir o barulho das ruas e reagendar suas decisões e vontades.
O mesmo se pode dizer do campo tecnológico e científico, pois o produto da ciência será tão mais eficaz quanto o seja de identificar e centrar na solução dos problemas. Caso contrário, se terá muitas respostas para perguntas não feitas e muitos resultados de pesquisa sem utilidade, sem uso prático e de discutível valor teórico.
A interação em todos os campos do conhecimento é o desafio que precisamos enfrentar, com humildade, muita atenção e profissionalismo. A nova era é a que será capaz de distinguir instituições e pessoas pela capacidade de somar esforços, fazer alianças, respeitar os espaços de competência e, principalmente, fazer do intercâmbio, compreendido como troca de conhecimentos, o paradigma para evoluir.
Em tempo de alta oferta de dados e informações, é preciso tornar as ideias ainda mais claras. Apenas informar, estender, transferir, difundir e centrar na mudança de atitudes das pessoas, para que sejam adotados comportamentos pretendidos (por quem emite), fazem parte da forma autoritária de ver o mundo. A nova educação ensina aos mestres a observar com atenção e método como os alunos pensam e como agem no processo de aprendizagem. O brasileiro Paulo Freire, na década de 1970, já advertira que a comunicação deveria prevalecer sobre a ideia de extensão. Suspeito que hoje é irrefreável valorizar a interação humana e o diálogo de saberes, o que pode acontecer numa conversa informal, ou mesmo na mais complexa das organizações, por meio de agendas, setores, departamentos e diretorias de intercâmbio.
Para finalizar esta reflexão, preciso dizer que o universo dos conceitos é uma das faces da questão na passagem entre o paradigma da informação para o do intercâmbio. Os conceitos estão imersos na lógica que satisfaz a ordenamentos anteriores e referem formas de agir. Antes deles estão os propósitos e as atitudes, as operações práticas a que eles se referem. Falo dos modos de agir “com”, incluindo as pessoas e instituições por meio de muito diálogo, e não “para” elas, desconhecendo conhecimentos e culturas originais. Num tempo em que a informação circulava para poucos, qualquer uma poderia servir, hoje não. A grande oferta de versões sobre as coisas do mundo requer que as ideias sejam claras, adequadas, verificáveis e mais honestas. Para isso é preciso investir fortemente em comunicação, com propósitos de interação e intercâmbio, valorizando a diversidade de conhecimentos.

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*jornalista, pesquisador da Embrapa

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